AS CERCAS DO MEDO

Um grupo de pesquisadores que percorre as zonas rurais de Caxias do Sul, atualizando o inventário do patrimônio cultural e paisagístico dessas localidades, está surpreso com um fenômeno. Os moradores estão com medo de abrir as portas e conversar com os visitantes, temendo estarem sendo vítimas de assalto. A qualquer movimento que percebem, vindo de fora, fecham janelas e portas e, possivelmente, alguém fique de olho na estrada, escondido, de trás da mira de uma espingarda.

         Há vinte anos, um pouco mais, fiz também esse percurso por dentro do município. Um pouco do que vi na época está na novela O Caso do Martelo: estava começando uma mudança de hábitos nas casas da colônia, com toalhas de renda de plástico e a televisão na mesinha da sala, no lugar antes ocupado pela imagem de um santo. Mas a vida ainda era tranqüila. As janelas não se fechavam, as portas se abriam, e a gente podia entrar, ver toalhas de crochê plástico, e conversar. A novela trata de um assassinato, baseada num episódio real, que na ocasião sacudiu uma comunidade inteira, de tão extraordinário que era o fato. Tão extraordinário que virou novela policial e terminou indo para a televisão.

         Hoje, não. Assaltos e assassinatos pelos pacatos lugares de nossas colônias se tornaram um pesadelo, uma preocupação a mais, a ser somada aos outros cuidados diários. Uma ameaça muito mais assustadora que a dos primeiros tempos da colonização, quando os moradores trancavam-se em casa com medo “da tigre”. E já se começa a perceber, nas moradias do meio rural, a adoção de um uso que na cidade de Caxias é quase universal: erguer grades de ferro para proteger as casas. Tenho um vizinho serralheiro cuja oficina fica zumbindo até altas horas da noite. Não estão lhe faltando encomendas. 

Enquanto isso, ficamos todos batendo cabeça para entender o que está acontecendo e para encontrar uma fórmula de dar um basta nessa situação. Endurecer a repressão, pelo que se vê, parece não estar dando o resultado esperado. A tática da queda de braço entre polícia e delinquente, a solução simples que todos pediam, não vai resolver o problema da criminalidade violenta. Vamos ter de pensar a questão com mais profundidade. O caso de Nova Iorque, que de cidade totalmente insegura passou a exibir notáveis índices de alívio para quem anda nas ruas, poderia servir como referência. Prometo falar desse caso na sequência.

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