O INVENTOR DO SONETO

Os sonetos de Francesco Petrarca foram um modelo de poesia lírica para toda a literatura ocidental. Ronsard, da Plêiade, que sonhava ser “o Petrarca francês”,  Shakespeare na Inglaterra, Francisco de Quevedo na Espanha, Sá de Miranda e Camões em Portugal, Gregório de Matos no Brasil, todos eles referência de base nas respectivas literaturas nacionais, juntaram  água dos sonetos de Petrarca nas suas jarras.

No Brasil, depois de Gregório de Matos, o soneto voltaria ao topo da glória na poesia de Cláudio Manuel da Costa. Teve um parêntese de sombra no romantismo e retornou com toda a pompa e circunstância no parnasianismo, que inventou o final com “chave de ouro”, e no simbolismo. Nem mesmo Machado de Assis foi imune ao seu feitiço. Pelo menos dois de seus sonetos ficaram na memória nacional: o alexandrino “Bailando no ar, gemia inquieto vagalume” e o “Querida, ao pé do leito derradeiro”, na despedida a Carolina, sem dúvida nenhuma a sua Laura.

Os modernistas lançaram diatribes contra o soneto e tudo o que soasse a parnasiano, mas nem os maiores deles conseguiram resistir à tentação do poema de quatorze versos. Drummond usaria o soneto alexandrino, com rimas completas, rima interna e tudo o mais, para declarar seu Legado: “Que lembrança darei ao país que me deu / tudo que lembro e sei, tudo quanto senti?” Manuel Bandeira no seu Lira dos cinquent’anos, passada portanto a febre demolidora, dá-se ao desfrute de escrever poemas com os títulos de “Soneto italiano” e “Soneto inglês”, isto é, rigorosamente no modelo de Petrarca e no de Shakespeare. E quem não conhece o “Soneto do amor como um rio”, do Mário Quintana, com assonâncias internas como requinte? Mas fiquemos por aí, para não expor outras celebridades.

Depois de haver traduzido os 317 sonetos de Petrarca, com o cuidado de eles não perderem de todo as rimas, saí à procura dos mestres do Poeta, que ele não deixa de homenagear em seu poema I Trionfi. Em particular, saí à procura do inventor do soneto como forma lírica. A única certeza que os arqueólogos da literatura têm assente é que o primeiro de que se conhecem os sonetos foi um poeta da “escola siciliana”, de nome Giàcomo da Lentini, também conhecido pelo nome de Jàcopo da Lentini. Era um importante notário, ou escrivão, da corte de Frederico II, que estimulou a produção de poesia em língua vulgar, a ponto de tornar a poesia siciliana uma referência para toda a Itália, em especial a Firenze de Dante Alighieri e a Toscana de Petrarca. Dante cita o poeta no Canto XXIV, que mostra o sexto círculo do Purgatório, com o nome pelo qual era conhecido por antonomásia, O Notário (Notaro).

À falta de outras provas, Giàcomo da Lentini é então considerado como o inventor dessa  forma métrica. Não há também certeza sobre as datas de seu nascimento e morte, mas seu nome é mencionado como membro da corte em escritos com data de 1233 e 1240. Dante nasceria em 1265 e Petrarca em 1304, ou seja, há uma geração separando entre si os três poetas. Giacomo da Lentini deixou 38 poemas de autenticidade reconhecida, mais dois ou três de autoria duvidosa. Desse total, 17 têm o nome de “Rime”, com o formato que em Petrarca e em Camões é chamado de Canção. Os outros 21 são sonetos.

Deixe um comentário

Crie um site como este com o WordPress.com
Comece agora