As muletas

Além (e) aquém (e) dentro (e) fora 

ao redor (e) sobre e toc e toc 

vão as muletas de meu verso 

tateando pelos espaços, tudo 

buscando situar. Amarei mais 

sabendo como um topógrafo 

o local preciso das coisas 

no giroscópio do universo? 

Mas como despegar-me das muletas  

sem tombar paralítico, 

com a nebulosa silabação 

dos guardadores de estrelas? 

Devo abdicar da linguagem? 

Será o silêncio uma paralisia,  

ou o movimento total, 

conquanto não mensurável? 

Aí está o tormento do poeta  

fabricador de palavras. 

Elas são traição do mistério entrevisto  

e no entanto um gesto irreprimível. 

As visões alucinadas se reduzem  

a um punhado de sons, um resto de borra. 

Essa a inglória faina do poeta,  

a de tudo macular 

na tentativa de clarear, 

a de dizer errado 

a luminosa verdade. 

(1959) 

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