Agora me dou conta. Em todas as vezes que presenciei uma festa de casamento, nunca prestei atenção no pai da noiva. Nem eu, nem ninguém. Quando ele entra pela nave da igreja, com música solene ecoando nos vitrais (se houver vitrais), não se percebe que ele entrou. Não é para ele a música, nem a espera ansiosa dos convidados e testemunhas. Os olhos todos estão na noiva, em cada um dos seus passos, em cada um dos refolhos do vestido, em cada pétala do buquê. Até nas fotografias só aparece ou só se vê a noiva e, ao lado dela, um ectoplasma evanescente, vestido de cinza. Ou nem isso. O pai da noiva não é nem ator coadjuvante. É apenas um mero figurante, para a noiva ter em quem apoiar o braço nesse momento de nervosismo, em que o corredor até o altar parece não ter fim.
Pois agora estou tendo a oportunidade de ver o pai da noiva de outro ponto de vista, e por uma elementar razão: vou estar na pele desse personagem da festa. Nada como a mudança de ponto de vista para a gente redimensionar a realidade. E nesse redimensionamento espero fazer justiça a todos os pais de noiva, seres invisíveis e impalpáveis, que passam despercebidos no casamento da filha. Não vou reivindicar aqui que ele, o pai da noiva, se torne visível e palpável, longe disso. A festa é dela e para ela devem estar voltadas as atenções dos olhos e das câmaras. Quero apenas dizer o que alguém, estando no ponto de vista em que ele está, com a vantagem suplementar de ser invisível, vê e sente, ou tem possibilidade de ver e de sentir.
Antes de tudo, ele vê uma noiva que ninguém mais na festa consegue ver. O que todos vêem é uma mulher no brilho da idade, avançando majestosa e sorridente no rumo que escolheu. Vêem todos, e sentem, um grande momento. Mas apenas um momento. O pai da noiva não. Vê a filha desde o seu primeiro momento até o de agora. O primeiro momento foi aquele em que ela, recém-nascida, sorriu para ele nos braços da enfermeira. Não adiantou virem os doutos, depois, com explicações de que ela não sorriu, não podia sorrir, que aquilo foi apenas um espasmo dos lábios. Para o pai, aquilo foi sim um sorriso, para sempre, mais perene que o de qualquer fotografia. No momento de agora ela também sorri, e desta vez sem controvérsia, um sorriso consciente, determinado. Apenas, como é inevitável, é um sorriso para o mundo. Para todos os que acolhem naquele passo, para o futuro marido que a aguarda lá adiante. É bom que o pai da noiva nessa hora fique invisível, porque ele na realidade não sabe nem que cara fazer: se faz uma cara de felicidade, vendo a sua menina tomar o próprio destino nas mãos e seguir impávida e serena como ele sempre quis, ou se deixa transparecer a ponta de tristeza que o assalta ao sentir que ela sai em definitivo do ninho em que viveu. Como disse, está certo que o pai da noiva não apareça. Ele seria capaz de estragar a festa se fosse percebido ali com sua dupla face.